Na montagem, nazistas na Champs-Elysées, em Paris: ontem e hoje |
por Valton de Miranda Leitão*
O modelo nazista de poder político e soberania nunca desapareceu da cultura ocidental após setenta anos da derrota do regime nazista, na II Guerra Mundial. Os pressupostos do pensamento nazi ficaram embutidos na mentalidade conservadora de setores intelectuais e políticos do ocidente, ressurgindo em muitos momentos deste período e agora reaparecendo com redobrada força em vários países e no Brasil. A intolerância e o preconceito contra as minorias se reagudizaram no nosso País, principalmente após o último pleito eleitoral, e tomaram a forma de um sentimento terrivelmente destrutivo de ódio, cultivado como se cultiva uma planta rara.
O jornalista alemão Timur Vermes, no livro “Ele está de volta”, mostra de maneira ficcional, mas certamente amedrontadora, o ressurgimento da visão nazista de mundo. O tema é tratado como uma comédia, mas nas dobras do humor, encontramos a presença do inimigo político que Carl Schmitt categorizou como presença universal em qualquer processo envolvendo o poder.
O específico do nazismo é que escolhe um inimigo a ser destruído após a batalha política, na qual o vencedor exige unanimidade de apoio. Nesse contexto, o Soberano não é o povo, mas o grupo vencedor, cujo líder promove uma constituição autoritária e despótica. A tentativa de desmontar ponto por ponto todos os ganhos sociais alcançados nos últimos doze anos pelos governos Lula e Dilma, e a expectativa do grupo político conservador, juntamente com o poder midiático, é varrer a entidade povo, tal como foi conceituado na Constituição de 1988.
A orquestração mundializada contra os regimes populares se exprime tanto na xenofobia quanto no desprezo crescente que os ricos devotam aos pobres. O retrato da concentração de renda no mundo foi feito por Thomas Piket, mostrando a dimensão da absurdez de 1% da população mundial deter quase 60% da riqueza planetária. No caso brasileiro, 10% da população detêm 75% da riqueza nacional.
O economista francês somente se esqueceu de tirar as conclusões, ou seja, de que houve uma inversão absurda na relação entre capital e trabalho, submetendo o trabalhador a condições cada vez mais aviltantes, por exemplo, o subtrabalho dos imigrantes na Europa, o trabalho semi-escravo no Brasil e a remuneração baixíssima do trabalho feminino.
A intolerância que grassa na Europa e EUA em relação a minorias não é somente xenófoba ou racial, mas envolve a relação entre direitos, de um lado e privilégios do outro, pois o privilegiado sente os direitos da população como ameaça aos seus privilégios. A desigualdade aliada à intolerância é o motor cultural do novo paradigma nazista de pensamento, que no Brasil assume o disfarce de leis protetoras, como terceirização e diminuição da maioridade penal. O negro brasileiro, nesta mentalidade, não é gente tal como o judeu não o era com Hitler.
Não adianta simplesmente taxar heranças e fortunas ultra bilionárias, mas é preciso restabelecer a dignidade do trabalho diante da sordidez do mercado capitalista.
* Texto publicado originalmente no jornal O POVO, edição de 14 de junho de 2015.
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