Pequenos fascistas italianos nos anos 40: a direita como território opaco do esquecimento |
Os tais "homens de bem" reivindicam, no plano público, a moralidade e a ética que são incapazes de reproduzir no âmbito privado. Os "defensores da pátria" refugiam-se no patriotismo (o último refúgio dos canalhas, como se sabe), quando, a rigor, servem de correia de transmissão aos que querem vender nossas riquezas, alienar nossa auto-determinação. Os "pagadores de impostos" ostentam o discurso patológico da "ameaça comunista", quando, na verdade, só sabem viver por dentro e à sombra do Estado frondoso, maquinando "jeitinhos" e benesses que tornam nossa experiência capitalista um regime ainda mais doente: uma livre-iniciativa patrimonialista ou um patrimonialismo de mercado.
No fim das contas, querem não a reforma política, não a prosperidade pela democracia, não a igualdade de direitos e oportunidades. Ao contrário, querem a não-política. A direita brasileira é o terreno da não-política. Seu estatuto midiático é o corolário de uma constrangedora incapacidade de formulação crítica e racional da realidade; suas respostas são movidas por uma amnésia histórica convenientemente crônica. A direita brasileira é o território opaco do esquecimento.
Em "Homens em tempos sombrios", Hannah Arendt lembrava que a descrição da existência humana feita por Heidegger dava conta de que "tudo o que é real ou autêntico é assaltado pelo poder esmagador da 'simples fala' que irresistivelmente surge do âmbito público, determinando todos os aspectos da existência cotidiana, antecipando e aniquilando o sentido ou o sem-sentido de tudo o que o futuro pode trazer". A marcha facista que deve se espalhar pelo País neste domingo é um cortejo insano e histérico dos que querem justamente matar o futuro, interditando o desejo e a política, para celebrar o eterno retorno de tempos sombrios. Querem fazer da história brasileira e da nossa incipiente democracia uma carroça abandonada na beira de estrada.
A direita brasileira é, hoje, o lugar dos que pensam pequeno e que querem continuar pensando pequeno - de preferência, da porta de casa pra dentro. "Olhos tão habituados às sombras, como os nossos, dificilmente conseguirão dizer se a luz era a luz de uma vela ou a de um sol resplandecente", nos lembra Hannah Arendt. A cegueira facista vai hoje às ruas e baterá no peito, orgulhosa de seu próprio entreguismo, de sua alienação política e histórica. A constatação mais difícil talvez seja a de que os tempos sombrios que se anunciam a partir de hoje não são novidade. Sabemos exatamente aonde podem nos conduzir.
Invertendo a beleza dos versos de Leminski: isso de ser exatamente o que se é ainda vai nos levar aquém. Enfim, se alguém perguntar por mim, diz que não fui por aí..
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